quarta-feira, 16 de abril de 2014

PROTEÇÃO


Fui caminhar, indagorinha. Tarde cinzenta e fria... Já não aguentava mais meu quarto me abraçando e tomando-me por inteiro, já não aguentava mais estar mergulhada naquela cama imensa sob um edredom que tem se apossado de mim, me envolvendo como se fosse um casulo. Eu me sentindo uma lagarta emaranhada em fios invisíveis sem saber o que fazer pra virar borboleta, querendo, na verdade, não virar, ficar ali para sempre. A televisão,  com vida própria, falando as coisas dela, o miado dos gatinhos da vizinha clamando por mãe, por comida, o som dos carros  correndo lá fora, vestígios de vida... Resolvi, vou caminhar! Tá tarde, eu sei, pode ser perigoso mas já passei tantos perigos nessa vida... E fui! Ruas desertas, o mar encapelado, a luz do dia partindo... E avistei um homem que vinha há uns 300 metros... Andava gingando. Mudei de "faixa". Ele também. Dei alguns passos e mudei novamente. Ele também. Aí, inflei o peito e enfrentei. Olhos nele, determinada. Caminhamos como num duelo. E qualquer medo ou receio que pudesse haver em mim sumiu de repente e pensei no meu Edinho: Ele deve estar aqui comigo me protegendo como sempre fazia. Deve tá voando sobre mim de braços abertos feito o Redentor e se esse homem vier fazer alguma coisa comigo o meu amor que agora, no céu, deve ter curado o coração e estar forte pra chuchu,  dará um murro tão forte  nele  que o jogará, voando,  no mar. E sei que vou ouvir sua gargalhada ao ver o pobre coitado tiritando de frio nessa noitinha cinzenta, lutando com as águas ondulantes e geladas da baia suja.
 A mais ou menos três metros de mim o homem desviou  pois me mantive firme torcendo, já na confiança e atrevimento, pra a imaginação se fazer real e eu saber com certeza  que o meu amor estava ali. Nos olhos do homem, quando passou por mim, olhando-me de soslaio, havia um brilho estranho... Tive a certeza!